quarta-feira, 3 de outubro de 2012

J'acuse! Um ato à brasileira: os autos e o mundo

     O ministro Marco Aurélio Mello foi indicado por Collor. Isso bastaria, para muitos,  para que ele se considerasse impedido para julgar qualquer crime de corrupção no país. Mas, no Brasil, esse país que não é para iniciantes, ele está no STF, julgando o processo imensamente midiatizado da  Ação Penal nº 470, denominada mensalão. 
    Acabo de assistir os votos do Relator, ministro Joaquim Barbosa, a quem já admirei, quando enfrentou Gilmar Mendes, numa sessão. Agora o olho como alguém que busca reconhecimento social, e que não parece buscar nos autos a precisão que todo jurista deva lapidar.
     A frase de hoje da novela da mídia brasileira é quod non est in actis non est in mundo (“o que não está nos autos não está no mundo”), o que significa que um juiz não pode supor, avaliar, julgar, sem que esteja nos autos. Se não, a injustiça impera. Um juiz não pode usar dados ou informações que ele sabe sem que estejam nos autos (inclusive se ele sabe demais, a ponto de contaminar sua imparcialidade diante dos autos, deve se julgar impedido).  Só assim a justiça é feita.
      No voto do relator, houve duas interrupções que me assombraram. Uma do ministro Marco Aurélio Mello. Assombrosa, ele ironicamente, no momento em que revisor do processo do mensalão, Ricardo Lewandowski, absolvia José Genoino, ex-presidente do PT, da acusação de corrupção ativa. Durante a fala do revisor ele pediu um aparte e ironizou: o senhor está quase a me convencer que o PT ... não sei se o complemento foi cometeu crime.. ou fez algo errado. O revisor Ricardo Lewandowski respondeu: de maneira alguma, pois condenei Delúbio Soares. 
      O que é interessante é que o PT não é reu no Processo. No momento os réus do Processo são 38 pessoas. Silvio Pereira fez um acordo e foi retirado do processo, e um dos réus faleceu, e portanto, não pode ser julgado. O PT não é réu do processo. 


Então, o que quer Marco Aurélio Mello?

  Outro fato que me chamou atenção foi quando o revisor falava de um recibo do Banco Rural e o relator Joaquim Barbosa veio julgar a validade do Banco, do recibo, se era falso. Desculpe ministro,  mas não é isso que está sendo julgado. Nem tem cabimento o senhor julgar a validade da prova. Se o que não está nos autos não está no mundo, o que está nos autos é TODO O SEU MUNDO. 

                  Então, o que quer Joaquim Barbosa?

(E olhe que um dia eu fiz uma petição a favor do senhor... Se arrependimento matasse...)

Parece que o show midiático lhe interessa mais que a verdade dos autos. Ao criminalizar a atuação de José Genoino Guimarães Neto, o senhor criminaliza não o ato político, mas o ato político de esquerda, o ato político nordestino, o ato político de quem defendeu os pobres, de quem honrou seu país e de quem manteve seu patrimônio modesto, como bem enfatizou o revisor.

Mas, algo muito maior me preocupa, e me tirou parte do sono esta noite. Não consigo dormir com isso com meus anos de pesquisa: como acusar e condenar um inocente sem provas???

E toda a jurisprudência que isto causa, ministro Fux, isto não lhe causa arrepios de medo? Esse fascismo judiciário, esse processo que transforma um presidente de partido em réu, porque ocupa um cargo não lhe lembra nada?


 J'acuse! - Eu acuso! Mon devoir est de parler, je ne veux pas être complice. - Émile Zola 
(Meu dever é falar, não quero ser cúmplice.) 

Como evitar que por todas as cortes deste país se acuse se provas??? Em que lugar nefasto iremos parar. Eu já vi isto. E nada me faz suportar o resultado. 


Acrescentando:

Irônico, Marco Aurélio disse exatamente: “estou quase me convencendo que o PT não fez repasse nenhum a parlamentares”. O PT não é réu no processo. Barbosa apontou: “a tradição do Banco Rural me leva a não levar nada a sério o que vem desse banco". O Banco Rural também não é réu no processo e não cabe  a ele validar provas... não desta forma. Eu começo a temer pelo Estado de Direito... parece que o único condenado, no frigir dos ovos é ele...

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