quarta-feira, 9 de abril de 2008

Por dentro da empresa que dominou o mundo


Em apenas uma década, o fenômeno Google conquistou um em cada seis habitantes do planeta e tornou-se símbolo da empresa do século 21. Agora enfrenta o desafio de continuar a crescer sem perder sua cultura vencedora
Por Larissa Santana, de Mountain Viewexame

O silêncio impera nos corredores e escritórios dos 30 prédios que compõem a sede do Google, em Mountain View, uma das cidadezinhas que compõem o mítico Vale do Silício, na Califórnia. Apesar do cenário típico de parque de diversões para adolescentes -- pebolins, máquinas de fliperama e consoles do Wii estão espalhados por quase todos os andares --, os cerca de 9 000 funcionários que trabalham ali têm pouco tempo para se divertir durante o expediente. Vestidos quase sempre com jeans, camiseta e tênis, esses jovens vindos de diversas partes do mundo raramente conseguem desgrudar os olhos de seus computadores. Alguns estão tão atarefados que chegam a pendurar uma placa nada receptiva com a ordem "Keep out"(ou "Fique fora") na entrada de suas baias ou salas. Os googlers, como são conhecidos os funcionários da corporação mais descolada do mundo, estão ocupados demais em fazer girar o motor de uma empresa cujas vendas cresceram mais de 1 000% nos últimos cinco anos. As partidas de pingue-pongue ou vôlei de praia podem esperar o final do expediente...

Desde que nasceu, de um projeto acadêmico de Larry Page e Sergey Brin -- em 1998, eles eram doutorandos da Universidade Stanford --, o Google tornou-se um fenômeno sob várias perspectivas. Page e Brin não foram os primeiros a pensar num sistema de busca de informações online (já estavam no páreo Yahoo!, AltaVista e Lycos, por exemplo). Mas eles conseguiram criar modelos matemáticos que fizeram de seu produto o melhor em comparação com o que a concorrência oferecia. No oceano caótico de informações da internet, o Google conseguia estabelecer ordem, colocar prioridades.

Page e Brin também inovaram -- e essa palavra cabe aqui como nenhuma outra -- ao mudar a dinâmica da publicidade online com os links patrocinados, anúncios exibidos na lateral de suas páginas, separados dos resultados de busca, e em uma rede de sites parceiros. Como esses anúncios aparecem de acordo com os termos buscados pelos internautas, os anunciantes têm acesso a consumidores diretamente interessados em seus produtos -- e só pagam ao Google quando alguém clica em seus links. Graças a esse formato, o Google tornou-se ao mesmo tempo um gigante da tecnologia e um colosso de mídia, com faturamento superior a 16 bilhões de dólares. E o mercado anunciante, antes restrito a um grupo de empresas, ganhou dimensões inimagináveis, acolhendo desde uma montadora como a GM até a São Bento Manutenção e Obras, pequena empresa de São Paulo que oferece serviços de chaveiro, pintor e marceneiro.

Hoje, mais de 1 bilhão de pessoas usam os produtos do Google para achar informações na internet -- o que representa a proporção de um em cada seis habitantes do planeta. Sua influência na vida cotidiana dessa multidão é tamanha que o termo Google já virou verbo em dicionários de inglês, alemão, finlandês e japonês. Em português corrente, pesquisar na internet já se transformou em "googlar". (A palavra que deu origem ao nome, "googol", significa o número 1 seguido de 100 zeros, e foi criada por uma criança, um sobrinho do matemático americano Edward Kasner.) Segundo a consultoria Interbrand, a marca da empresa foi a que mais se fortaleceu em 2007, alcançando valor estimado em 17,8 bilhões de dólares e a 20a posição no ranking das mais valiosas do mundo. A expansão acelerada tornou o Google um dos maiores mercados abertos de trabalho de que se tem notícia. Em média, são contratadas 16 pessoas por dia -- atualmente a empresa emprega 17 000 funcionários em 37 países.


Tudo isso aconteceu em apenas uma década. A combinação de inovação, tecnologia pura, relação íntima com os consumidores, rapidez, informalidade, reputação e crescimento meteórico baseado na conquista das melhores cabeças espalhadas pelo mundo transformou o Google no símbolo do que é a Empresa (assim mesmo, com letra maiúscula) do século 21. Construir uma companhia inovadora é difícil. Mantê-la assim, quando se tem uma estrutura gigantesca nas mãos e uma miríade de interesses conflitantes para acomodar, é quase impossível. "Preservar a cultura da nossa empresa enquanto crescemos é definitivamente um de nossos maiores desafios", disse a EXAME Eric Schmidt, principal executivo do Google desde 2001 (leia entrevista na pág. 28).

Outras empresas, algumas vizinhas ao Google no Vale do Silício, já enfrentaram o mesmo dilema -- nem sempre com sucesso. O paralelo mais próximo dessa transformação talvez seja a trajetória da Microsoft, que após décadas de crescimento inacreditável sentiu o peso do gigantismo sobre sua capacidade de se renovar. A empresa de Bill Gates mudou o mundo de forma incontestável, fez de nerds milionários, arruinou concorrentes. Mas, com o tempo, entrou num círculo vicioso que começa e termina na perda de talentos e na dificuldade de inovar na era da internet. Foi esse cenário que levou a Microsoft a, recentemente, fazer uma oferta de 44,6 bilhões de dólares pelo Yahoo!, numa tentativa de comprar o conhecimento necessário para duelar com o Google daqui para a frente.

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