Os bispos católicos franceses se dizem fiéis e leais ao Papa Bento XVI, mas não escondem sua estupefação diante da suspensão da excomunhão dos quatro bispos integristas da Fraternidade Sacerdotal São Pio X, ordenados pelo Monsenhor Marcel Lefebvre, informou o jornal La Croix. O episcopado francês se mostra relutante e apreensivo, a julgar pelos depoimentos aos meios de comunicação.
O Cardeal Jean-Pierre Ricard, arcebispo de Bordeaux e membro da Comissão Pontifícia Ecclesia Dei, aponta o nó da tensão: "Num dado momento, a questão do próprio texto do Concílio Vaticano II como documento magisterial da maior importância, deverá ser posto. Ela é fundamental. Mas todas as dificuldades não serão necessariamente de tipo doutrinal. Outras, de tipo cultural e político, podem também emergir. As últimas declarações, inaceitáveis, de Monsenhor Williamson, negando o drama do extermínio dos judeus, é um exemplo", enfatizou.
Reação semelhante foi a do Monsenhor Hippolyte Simon, Arcebispo de Clermont e vice-presidente da Conferência Episcopal. "O papa concedeu aos integristas tudo o que eles queriam sobre a forma dos ritos, mas sobre a questão de fundo, sobre o Concílio, quando afirmou que não existem dois ritos, mas duas formas de um mesmo rito, ele arruinou sua argumentação". Por isso, ele insiste que o Vaticano II seja aceito em sua totalidade e teme pelo retorno, por causa das dissensões internas dos lefebvristas.
Monsenhor François Garnier, arcebispo de Cambrai, disse que os padres e leigos se sentem "caluniados de maneira altaneira e orgulhosa" com a atitude dos integristas, pondera sobre a necessidade de humildade das duas partes, mas disse que não vê esta atitude nos seguidores de Lefebvre, que nunca pararam de desprezar padres e bispos fiéis ao Concílio, com um orgulho esmagador. Até o Monsenhor Marc Aillet, bispo de Bayonne, solidário à decisão de Bento XVI, reagiu às declarações do Monsenhor Williamson, declarando-as "muito graves".
O responsável pelo diálogo judeu-cristão, Monsenhor Maurice Gardès, arcebispo de Auch não esconde o assombro: "Essas declarações se chocam com todo o trabalho realizado desde o Concílio em direção aos nossos irmãos judeus. Não se pode ser cristão e negar a eliminação de seis milhões de judeus. Nossos amigos judeus só podem se sentir desprezados pela decisão da Igreja de aceitar em seu seio um bispo que defende uma tese negacionista. Que exigências foram postas? Quais as condições? Eu não sei. É assombroso que a decisão não tenha sido acompanhada de maneira explícita pelo enunciado de condições".
O bispo de Versailles, Monsenhor Éric Aumonier, pede a unidade, mas expõe os limites: "Bento XVI, assim como João Paulo II, não pode aceitar que subsista uma rachadura no tecido da Igreja sem que se tenha tentado de tudo para remediá-la e que a unidade seja verdadeira. É por essa razão que as excomunhões foram levantadas". Mas reconhece, "será preciso tempo para que todos os católicos adiram de maneira firme e total ao magistério da Igreja, assim como se expressa hoje".
O cerne da dificuldade de relacionamento com os lefebvrianos na França passa pela história do integrismo, de Charles Maurras, de um lado, e pela dificuldade de conciliação desta perspectiva com os avanços do Concílio Vaticano II na Europa. Ao que dizem os bispos franceses, o ressentimento, o anti-semitismo e a antimodernidade não deixam que os seguidores de Lefebvre correspondam ao gesto generoso de Bento XVI. Se a intenção da decisão era a unidade, as reações parecem demonstrar que ela ficou mais distante.
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